Especiais

Da infância artística ao apoio a jovens artistas em busca de visibilidade

Celaine Refosco, pintora e curadora artística, fala sobre a relação com a arte e o trabalho feito com jovens que procuram seu espaço no meio artístico

10 de agosto de 2024

Foto: Joana Prochera / JP

“Arte é uma capacidade de trafegar entre a nossa parte objetiva e a nossa parte subjetiva”, assim iniciou o relato de uma mulher artista, pintora e curadora. Celaine Refosco nasceu em Joaçaba, no Oeste de Santa Catarina, mas atualmente reside em Pomerode. Em seu atelier, guarda memórias e trabalhos feitos por ela ao longo dos anos de carreira como artista.

Ela e o irmão conseguiram convencer os pais de que iriam graduar um curso artístico. Seu irmão estudou música e Celaine iniciou o Bacharelado em Pintura na Universidade Federal de Santa Maria e depois concluiu o curso na Escola de Música e Belas Arte do Paraná. “Foi uma coisa muito especial, significa que a família tinha uma abertura para isso, eles poderiam não entender, mas eles respeitavam de alguma forma. Havia um medo que a gente não sobrevivesse disso, que é o medo que todo mundo tem”, relembra a artista.

Celaine também recorda como se descobriu no meio artístico e conta que foi nesta área que ela construiu um lugar de saúde. No período de sua infância, a artista trabalhou, desenhou e gastou seu tempo fazendo coisas artísticas, o que era sua maior alegria.

“Eu me reconheci como uma criança diferente das outras crianças, entre os 04 e 05 anos de idade dava para perceber que eu tinha uma coisa. Eu não sabia que aquilo era arte, eu soube mais tarde. As pessoas viam que eu era sensível como criança. Mas é quase como se eu tivesse um lugar para onde eu conseguia ir e me afastar do mundo, das coisas que eu não gostava, dos problemas, do bullying, de tudo de complexo que a vida oferecia”.

A pintora já realizou várias exposições. Para Celaine, todas foram muito especiais, pois ela insistia e se dedicava muito para fazê-las. Ela relembra de uma exposição marcante que foi realizada no Sesc de Curitiba, onde havia grandes desenhos de cadeiras em tamanho real, todas elas em diferentes formas, que foram desenhadas rapidamente.

Em todos os anos de profissão ela foi encontrando diversas referências. Tiveram pessoas que marcaram sua trajetória, pela maneira que conduziam suas carreiras, pelas pinturas subjetivas, pelo aspecto estético, cores e até mesmo pela escolha dos temas das obras.

No decorrer dos anos, Celaine precisou deixar de lado o sonho de seguir na profissão de pintora para seguir na carreira de Designer. Segundo ela, artistas têm muita dificuldade em encontrar a visibilidade no mundo profissional, até mesmo pela parte econômica que acompanha a profissão.

Apesar desta pausa na carreira, Celaine não desistiu e nem esqueceu do seu sonho de continuar sendo pintora. A artista encontrou uma base sólida e retornou gradativamente sua atuação tanto na área de pintura, como também na área de curadoria de projetos artísticos.

Exposição artística Rui’s One Chair, da artista Isadora Batista, cuja curadoria foi feita por Celaine. (Foto: Arquivo pessoal)

 

O papel de um curador é encontrar viabilidade para expor o trabalho do artista. Olhando tanto para a parte subjetiva do artista, quanto para a parte objetiva. Ela se considera uma curadora intuitiva, pois sempre teve que ser organizadora de seus próprios trabalhos.

A artista começou a perceber que algumas pessoas tinham mais dificuldade nesta parte do processo, então ela iniciou a curadoria espontaneamente, sem saber que estava realizando esse papel. À medida que ela foi crescendo, percebeu que outras pessoas, de diferentes faixas etárias, se beneficiavam desse olhar, dessa possibilidade de parar, olhar e organizar.

Celaine realiza a curadoria para diferentes artistas, tanto pintores quanto fotógrafos. O que chama a atenção, é que a pintora participa de muitos projetos feitos por jovens. Para Celaine, eles são muito disponíveis, interessados e frequentemente se encontram sem oportunidades, pois não há um sistema da arte, como existe em outros lugares, onde há começos marcados.

“Eu acho que fui muito marcada pelo meu começo, que foi tão difícil e eu tive que parar de pintar e ser designer. Às vezes eu penso que se tivesse alguém um pouco mais atento àquele meu momento, eu teria permanecido na arte sem precisar fazer essa grande curva para ser designer, para ser empresária da área de educação, para depois conseguir achar o meu jeito de fazer e voltar à pintura”, explica a curadora.

Foto: Arquivo pessoal

 

Para ela, este é um momento emocionante, pois os artistas jovens têm a oportunidade de aprender sobre curadoria ainda no início de suas carreiras e, assim, eles podem evitar ficar tristes por não acharem lugar para o trabalho deles, ainda por ser um momento que muitos correm o risco de desistir nessa fase.

Celaine aconselha os jovens que estão entrando na vida profissional artística, dizendo que o grande segredo é achar um jeito de não desistir e continuar atuando. Além disso, é necessário trabalhar muito, ler muito, ser ativo, pois a ideia da letargia precisa ser afastada.

“A desistência é sempre a coisa mais triste de todas, porque ela equivale a uma entrega de si mesmo e prol de qualquer outra coisa”, expressa a curadora.

Com toda essa trajetória da artista, o significado da arte se ampliou muito para ela, no sentido de entender como funciona o mercado para custo das artes, da precificação e de quanto é necessário colocar a subjetividade e objetividade nos projetos. Durante a carreira, ela também aprendeu sobre a história dos outros artistas, principalmente dos esquecidos ou os que nunca se consideraram artistas.

Para Celaine, um dos grandes desafios de quem trabalha na área artística é provar para outras pessoas que uma arte pode ter um valor e, muitas vezes, esse valor poderá ser alto. A artista relata que o ambiente cultural é muito retraído e nós, como comunidade, temos tendência a valorizar coisas materiais, mas não os materiais que nascem a partir da subjetividade. “Ninguém olha um bordado e fala nossa que lindo, que maravilhoso, que grana isso pode custar”, comenta Celaine.

Além disso, há uma confusão que as pessoas fazem ao analisar as pinturas. Quando parece que alguma pintura demorou muito para ser feita, ou é muito detalhada, ela passa a ser valorizada. Mas quanto menos figurativa ela é, menos é valorizada. Segundo Celaine, isso é um traço cultural, mas isso também se dá ao fato de estarmos perto demais da indústria, perto do funcionalismo.

“Eu gostaria de explicar para as pessoas o valor da arte, porque arte é diferente de uma geladeira ou de um sapato. Quando você compra um sapato, ele começa a valer menos. A arte é o contrário, ela começa a valer mais”, finaliza a pintora.

Notícias relacionadas