Uma batalha sem fim
O autismo, também chamado de Transtorno do Espectro Autista, é um Transtorno Global do Desenvolvimento (TGD) que tem influência genética e é causado por defeitos em partes do cérebro, como o cerebelo, por exemplo.
O autismo, também chamado de Transtorno do Espectro Autista, é um Transtorno Global do Desenvolvimento (TGD) que tem influência genética e é causado por defeitos em partes do cérebro, como o cerebelo, por exemplo. Pessoas com esse distúrbio possuem dificuldades qualitativas na comunicação, interação social e a imaginação e consequentemente problemas comportamentais.
Todas essas alterações costumam aparecer antes mesmo dos três anos de idade, em sua maioria, em crianças do sexo masculino. Para o autista, o relacionamento com outras pessoas costuma não despertar interesse. O contato visual com o outro é ausente ou pouco frequente e a fala, usada com dificuldade. Algumas frases podem ser constantemente repetidas e a comunicação acaba se dando, principalmente, por gestos. Por isso, evita-se o contato físico no relacionamento com o autista – já que o mundo, para ele, parece ameaçador. Para minimizar essa dificuldade de convívio social, vale criar situações de interação. A paciência é requisito fundamental para lidar com autistas, já que pelo menos metade deles apresenta graus variáveis de deficiência intelectual. Alguns, ao contrário, apresentam alto desempenho e desenvolvem habilidades específicas – como ter muita facilidade para memorizar números ou deter um conhecimento muito específico sobre informática, por exemplo. Descobrir e explorar as eficiências do autista é um bom caminho para o seu desenvolvimento.
Atualmente o assunto está em evidência, pois o autismo está sendo vivido por uma das personagens da novela, a jovem Linda, interpretada por Bruna Linzmeyer. No fim do ano passado, o Jornal de Pomerode recebeu um e-mail encaminhado pela professora Edna, do Ueja, onde uma mãe relatava um pouco da história de vida, vivida por ela e o filho autista. Ela se propôs a conversar com a equipe do JP e contou-nos um pouco sobre como é a vida dela e do filho.
A princípio eu fiquei tão apreensiva quanto qualquer outra pessoa, porque nem eu mesma sabia o que era autismo na época. Quase ninguém sabia. Essas são as primeiras palavras de Ruth Steinert. Seu filho, Sven Steinert, tem 32 anos e é autista.
O filho foi diagnosticado com autismo em 1989, quando tinha sete anos de idade. A partir daí Ruth iniciou uma longa jornada, que ainda não chegou ao fim. O médico indicou que Sven frequentasse uma instituição adequada, mas na época, e ainda hoje, Pomerode não dispunha de tal local. Sven foi encaminhado para a Apae, mas não ficou lá por muito tempo.
Por falta de um local adequado, a família teve que buscar instituições fora de Pomerode, mas sem muito sucesso. Naquele tempo souberam que havia sido fundada uma instituição em uma cidade próxima, então viram ali uma esperança. Meu marido e eu fomos até lá para legalizar toda parte burocrática, só que para nossa surpresa, quando chegamos lá recebemos um não. Disseram que nosso filho não poderia frequentar o local, pois morávamos em outra cidade e que isso só seria possível se pelo menos meu marido trabalhasse na cidade. Então ele tentou um emprego lá, mas não conseguiu. Tentamos nos mudar para lá, mas também foi negado pelo fato de que não trabalhávamos na cidade, conta.
Em razão disso, Ruth foi até a Prefeitura para tentar uma ajuda com a condução para se deslocar ao município vizinho, mas novamente recebeu uma resposta negativa.
Depois de muito tentar, e sem perspectivas, acabamos cansando e foi aí que eu tomei a decisão de deixá-lo em casa e fazer o melhor que eu podia por ele, desabafa. Por isso, durante muitos anos Sven ficou em casa e Ruth exercia o papel de mãe e professora.
A mãe até tentou colocar o filho em uma escola regular, mas a tentativa durou apenas três meses. A diretora me chamou na escola e disse que meu filho não podia continuar estudando lá, pois atrapalhava os outros alunos, conta. Na época não tinha aquela Lei que diz que ele tem o direito de frequentar uma escola, completa.
A lei à qual ela se refere é a Lei 12.764/12, que institui a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista. Sancionada em dezembro do ano passado pela presidente Dilma Rousseff, a medida faz com que os autistas passem a serem considerados oficialmente pessoas com deficiência, tendo direito a todas as políticas de inclusão do país – entre elas, as de Educação e também assegura outros benefícios legais de portadores de deficiência, que incluem desde a reserva de vagas em empresas com mais de 100 funcionários, até o atendimento preferencial em bancos e repartições públicas.
Para Ruth Steneit, porém, a Lei funciona só no papel. Assim como a questão da inclusão social de pessoas com deficiência. Para ela, está muito longe de fornecerem os direitos que a Lei assegura, principalmente na questão de saúde.
Ela diz que para o filho o que falta é o acompanhamento de especialistas, como fonoaudiólogo e psicólogo, mas tudo isso se for particular custa muito caro e pelo Estado quem precisa não consegue. Alguns lugares dizem que não tem obrigação de ajudar, que tratam apenas de casos de transtorno temporário. Todos têm uma desculpa para negar atendimento. Resumindo: Mãe, continua se virando como você sempre fez, afirma Ruth.
Ela conta que o que mais ouviu de profissionais de saúde, ao invés de palavras de incentivo e apoio, foi que o caso não tinha solução. Já cheguei a ouvir de psicólogos que meu filho ia ser esquizofrênico. Outros disseram que ele até teria alguma chance de tratamento, mas que eu não teria dinheiro suficiente para isso. Já faz muito tempo que ouvi coisas deste tipo, mas elas marcam a vida da gente, desabafa.
Hoje, depois de tanto tempo, mãe e filho aprenderam a lidar sozinhos com o autismo e, embora muitas pessoas pensem que os autistas são totalmente dependentes, o dia a dia de muitos deles é normal. A rotina diária de Sven é bem tranquila, ele tem o seu próprio computador onde passa uma parte do tempo e gosta de navegar na internet. Também gosta de escrever, ler, estudar, assistir TV. Ele não precisa de ajuda para nada, pelo contrário. Muitas vezes ele me ajuda, diz Ruth.
Tem pessoas que reclamam, dizem que os autistas não entendem nada. Como é o caso da novela que a Leila, irmã da Linda, acha que a irmã é uma inútil, que não serve pra nada. Mas na verdade é fácil lidar com um autista. É só tratá-lo com jeito, afirma.
Na novela eles mostram algumas coisas que são reais, mas muito é ficção. O intelecto mostrado na atriz é tão rápido, ela raciocina rapidamente, faz perguntas e responde aos estímulos e na realidade isso não funciona assim. Mesmo sabendo que há mais de 300 tipos diferentes dentro do autismo, mas até hoje eu não conheci nenhum caso assim, diz. Um dos pontos é a audição. Os autistas não suportam alta frequência, barulhos muito altos. Meu filho também já passou por isso, mas hoje já amenizou bastante. Além do barulho ele também não suporta cenas de violência na TV. Quando ele está assistindo algum programa e aparecem essas imagens eu logo tenho que mudar de canal ou desligar a televisão.
A mãe conta que já passaram por alguns casos de preconceito e lembra-se de um deles, quando Sven ainda era criança. Entramos em uma lanchonete e ele estava bastante agitado. Foi quando uma pessoa que estava no local se virou, ficou olhando e disse que ele parecia louco. Atualmente ela diz que isso não acontece mais, que as pessoas aprenderam a respeitar as diferenças.
Embora tenham passado por todas essas adversidades, mãe e filho comemoram uma conquista muito importante, encarada como uma vitória. E consegui matricular o Sven no Ueja. Para nossa surpresa ele está indo muito bem, até melhor do que esperávamos. Sempre foi o desejo dele de frequentar uma escola. Eu ensinava em casa, mas ele não aceitava e dizia que mãe não é professora. Ele via todo mundo ir para a escola e também queria. No Ueja ele se sente bem, convive com os outros alunos. É a realização de um sonho, comemora. Ela afirma ainda que este ano vai voltar a frequentar um banco escolar para completar os estudos. Eu vou voltar a estudar, terminar meus estudos e também para acompanhar o meu filho mais tarde. Vamos aprender juntos, um ensinando o outro, diz.
Para Ruth é necessário que haja um local para apoiar os autistas e seu maior desejo é formar um grupo de pais que têm filhos autistas para que juntos, possam encontrar caminhos para a inserção dos mesmos na sociedade.
No começo eu estava sozinha nesta causa, ninguém conhecia o autismo. Hoje nós temos crianças autistas em Pomerode e ainda não temos um local para elas. Eu acho interessante que todos os pais de autistas se reúnam para trocar ideias e ver o que é possível fazer pelas nossas crianças. Uma boa iniciativa seria fundar uma instituição própria para auxiliar o autismo, para poder compartilhar experiências, conhecimentos e lutar pelos direitos dos autistas, diz.
Para finalizar ela recomenda aos pais que tem filhos autistas assistirem o filme Uma Viagem Inesperada, que conta a luta vivida por uma mãe que tem dois filhos gêmeos e autistas e que, graças ao apoio incondicional da mãe, conseguem superar as dificuldades impostas pela doença.