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O seu lixo, o meu trabalho

Quarta-feira, 21 de maio. Um dia comum para a maioria das pessoas, mas que, para mim, tornou-se uma experiência de vida e um desafio a ser superado.

1 de junho de 2015

Quarta-feira, 21 de maio. Um dia comum para a maioria das pessoas, mas que, para mim, tornou-se uma experiência de vida e um desafio a ser superado.

O dia começou mais cedo e também com uniforme. Eram 7h da manhã quando já estava utilizando a tradicional roupa laranja, o sapatão preto e as luvas. O destino: Testo Rega. O motivo: recolher o lixo orgânico da região. Sim, isso mesmo. Mão na massa. Meu dia de sair da rotina.

Assim que cheguei à usina de lixo reciclável, no Ribeirão Clara, as boas vindas e os olhares empolgados com a visita e a minha nova experiência logo puderam ser confirmados quando apareci de uniforme. E, então, as palavras foram: boa sorte.

O primeiro obstáculo a ser superado foi conseguir me equilibrar, em pé, atrás do caminhão em movimento e descer dele inúmeras e incansáveis vezes para me abaixar, levantar, arremessar sacolas e, depois, começar tudo de novo. O segundo e o que mais incomoda, principalmente, para quem não trabalha com isso: o cheiro. Acreditem, o caminhão tem cheiro ruim até vazio! Cheiro esse proveniente de todas as coisas que jogamos fora, de maneira inadequada muitas vezes, e achamos sem serventia, mas que passam pelas mãos de pessoas que não se intimidam em recolher o que jogamos fora.

Pois bem, hora da labuta! Acompanhando-me nessa empreitada, Mario e Mauricio, além do Edson no comando do caminhão. Então seguimos rumo a nosso roteiro, que começou logo após a ponte de acesso ao Wunderwald.

E logo na primeira rua rostos conhecidos me reconheceram, mas não entenderam o que estava fazendo. Tudo bem, era para ser surpresa mesmo! Em seguida, rostos desconhecidos começaram a reparar na minha inusitada presença. E foi nesse momento que percebi que o trabalho de coleta de lixo nas ruas, em nossa cidade, não é efetuado por mulheres. Portanto, a minha presença gerava muito mais curiosidade por conta da função que estava exercendo.

E assim seguimos. Após algumas ruas e ritmo intenso de trabalho, já pude constatar uma triste realidade em Pomerode: a falta de separação de lixo reciclável do orgânico. É comum encontrar garrafas plásticas misturadas com restos de comida, papel com folhas de árvores, grama com latinhas de cerveja. E, com essa mistura, tudo vai parar em um único lugar: o aterro sanitário.

Além disso, pode não parecer, mas o trabalho é muito mais desgastante do que parece. Não havia passado nem três horas e eu já possuía calos nas mãos e nos pés, enquanto o cansaço já transparecia em meu rosto.

Nas horas seguintes, sacolas, tambores, restos de alimentos, ovos podres, galhos, folhas, colchão, fraldas, papel higiênico e muitas outras coisas fizeram parte da minha manhã. Acreditem, até fezes eu encontrei. E, claro, um rato que fugiu depois do meu grito de desespero.

Risadinhas a parte, a dupla que me acompanhou merece muito mais do que palavras de incentivo e reconhecimento. Digo, agora, por experiência própria, que lidar com o lixo dos outros não é nada fácil.

São tambores pesados, fedorentos e sem tampa. É estrada de chão com poeira, morros para subir e lixo para catar, até no meio do mato. A rotina começa cedo e termina só no meio da tarde, o que significa que as minhas quatro horas de atividades são apenas metade do que fazem diariamente.

No entanto, apesar da imensa experiência e do conhecimento adquirido, o que mais me entristece é que o trabalho realizado por esses profissionais, dificilmente é devidamente valorizado. Já imaginou ficar um mês sem coleta de lixo?

A maneira como o lixo é despejado, a cara feia quando o caminhão passa ou bloqueia o trânsito, as buzinadas desnecessárias são muito frequentes, enquanto os rostos simpáticos, os cumprimentos e os agradecimentos quase não se fazem presentes.

No entanto, mesmo assim, quem trabalha com o nosso lixo, sempre está de bom humor, sorrindo e acostumado a lidar com aquilo que rejeitamos. Ao contrário do que se pensa, trabalhar com o lixo pode ser rentável e gratificante.

Acostumar-me com o peso dos sacos, o sol que aparecia de vez em quando e o mau cheiro não foi nada fácil, mas confesso que achei que seria impossível. Fugir de cachorros, auxiliar a manobrar o caminhão de ré e sempre manter a comunicação com o motorista também são outras de suas habilidades.

Por que para coletar tanto lixo é preciso mais do que ter bom preparo físico, é preciso ter agilidade, atenção, bom reflexo, além de resistência para lidar com os inúmeros obstáculos que o dia a dia oferece. Afinal, faça chuva ou faça sol, eles estão sempre lá, em cima do caminhão, correndo quilômetros por dias para deixar tudo organizado.

E quando o meu tempo junto com Mario e Mauricio encerrou, pude, ainda, aproveitar algum tempo com os demais colaboradores na esteira da usina de reciclagem. E lá, achei que nada mais me surpreenderia, doce engano.

Algumas sacolas abertas e uma grande quantidade de roupas surge, junto com mochilas de escola, sapatos e restos de comida. Alguém acredita mesmo que isso seja reciclável?

Conversando um pouco com meus novos colegas, mais informações. Gato morto e outros animais também já foram encontrados na esteira.

Apesar de serem chamados de lixo, muitos dos materiais que jogamos fora podem ser reutilizados e vendidos. Nestes casos, o valor volta a nosso município para manutenção dos caminhões e demais necessidades. Lixo gerando dinheiro para o próprio setor, sem ter que utilizar de outro.

Ser ecologicamente correto não é tão difícil assim. Exige um pouco mais de paciência para a separação do lixo, mas vale a pena para mim, para você, para nosso ambiente, para quem trabalha com isso.

Mais do que uma experiência, aprendi que por mais que se fale em reciclagem, em bons modos e educação, o exemplo sempre deve partir de nós mesmos. Somos todos pomerodenses lutando por melhorias na saúde, na educação, na economia. Por que não brigamos também por práticas e ações educativas em relação ao nosso lixo?

Passava do meio dia quando a foto oficial do Saindo da Rotina foi tirada. E, em cinco horas, conheci pessoas, histórias e aprendi que o meu lixo vai refletir diretamente no trabalho dos outros. E, já sem uniforme, poderei contar, com orgulho, a profissão exemplar que escolhi para vivenciar por algumas horas.

Parabéns a todos os colaboradores da usina que suam a camisa e fazem com orgulho e paixão o que muitos nem se dão ao trabalho de notar. Obrigada pelo aprendizado, pela parceria, pelo bom humor e pela companhia.

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