Ingestão perigosa
Dados indicam que a cada 36 horas um jovem brasileiro morre em consequência do consumo abusivo de álcool
O uso abusivo do álcool por jovens tem crescido nos últimos anos. A morte do universitário, Humberto Moura Fonseca, de 23 anos, na cidade de Bauru, após ingerir 30 doses de vodca em uma festa no início do mês, foi apenas um dos inúmeros casos registrados no Brasil. Dados levantados pelo jornal O Estado de S. Paulo no portal Datasus mostram que, a cada 36 horas, um jovem brasileiro morre de intoxicação aguda por álcool ou de outra complicação decorrente do consumo exagerado de bebida alcoólica.
De acordo com informações do Ministério da Saúde, um estudo da Organização Mundial de Saúde (OMS) divulgado em 2011, aponta que pelo menos 2,5 milhões de pessoas morrem todos os anos em virtude do consumo inadequado de álcool.
Os especialistas do órgão analisaram 100 países e concluíram que o consumo nocivo de álcool afeta principalmente os jovens e causa uma série de doenças. Por ano, cerca de 320 mil pessoas de 15 a 29 anos de idade morrem devido ao consumo de álcool. Informações obtidas pela Revista Veja, indicam que em 2012 aconteceram 242 mortes na faixa etária dos 20 aos 19 anos, causados por “transtornos por causa do uso de álcool”.
Para os especialistas, o consumo nocivo de álcool é caracterizado pelo uso excessivo a ponto de causar danos à saúde e outras consequências. Os principais fatores de risco para os consumidores de bebida alcoólica são o fato de eles fumarem, a má alimentação e o sedentarismo. As doenças mais frequentes causadas pelo consumo são as sexuais, cardiovasculares, vários tipos de câncer, diabetes e problemas pulmonares crônicos.
Pesquisa da Unifesp aponta que em 2012 houve um aumento de 14% de brasileiros que consomem pelo menos cinco doses de bebida em um período de duas horas, em relação a 2006.
Para falar sobre o assunto, o Jornal de Pomerode entrevistou a psicóloga, Cláudia M. Kinzel Baptista, que esclareceu alguns pontos sobre o consumo de álcool entre os jovens.
Jornal de Pomerode – O que faz os jovens terem interesse em iniciar o consumo de bebida alcóolica?
Cláudia M. Kinzel Baptista – Desde muito cedo as pessoas convivem com o álcool, que por ser uma droga lícita, está em quase todos os lares, em confraternizações e espaços sociais. O jovem vê frequentemente pessoas brindando e expressando felicidade. Além disso, muitos problemas são tratados de forma química, por exemplo, dores, machucados, insônia ou tristeza: toma-se remédio. Na juventude, diante de todas as mudanças corporais e psicológicas, o jovem sente insegurança frente aos demais, sua autoestima é bastante vulnerável, depende da aceitação do outro. O álcool é percebido por muitos como uma forma fácil de desinibição. A vergonha e a insegurança diminuem com a ingestão do álcool.
J.P. – No dia 1º de março um estudante de 23 anos morreu após participar de uma competição de ingestão alcóolica. O que leva os jovens a praticarem atos como esse?
C.M.K.B. – No caso do jovem que morreu na competição, penso que é um caso extremo, de um grupo de pessoas, cujas atitudes foram irresponsáveis, consigo e com os outros. Dificilmente fossem desinformados, procuravam um tipo de vínculo duvidoso, de desafiar aos outros e para não serem chamados de covardes, entravam na perigosa brincadeira. Os motivos podem ser muitos, como autoafirmação, curiosidade, fuga de problemas ou desajustes familiares.
J.P. – Para a família, como é possível perceber se está ocorrendo um descontrole em relação a bebida?
C.M.K.B. – Na família, percebe-se que algo está errado quando o adolescente chega tarde, dá muitas desculpas, deixa de cumprir com seus compromissos, tem comportamento arredio e o cheiro de bebida alcoólica é sentido com frequência. É imprescindível que haja diálogo desde a infância, reconhecer os sentimentos da criança, conversar sobre os acontecimentos em geral e ajudar a enfrentar pequenas frustrações com carinho.
J.P.- Quanto o uso abusivo da bebida pode ser prejudicial para a vida da pessoa?
C.M.K.B. – O uso abusivo pode levar a dependência, ao etilismo (nova nomenclatura para alcoolismo). Muitas consequências podem advir daí, brigas em família, desgastes, perdas irreparáveis, depressão, suicídio.
J.P. – Como é possível fazer com que o jovem perceba que está passando dos limites?
C.M.K.B. – Um jovem que esteja indo por este caminho deve ser alertado, por familiares e amigos de que às vezes é um caminho sem volta, envolve perda da liberdade de escolha, uma vez que a pessoa passa a viver em função do álcool. A doença é difícil de tratar, exigindo muito esforço, tanto do sujeito como dos que o cercam, justamente porque a bebida está em praticamente todos os lugares.
J.P. – Existe um modo “saudável” para ingerir bebidas alcóolicas?
C.M.K.B. – O modo saudável de lidar com o álcool, além de dialogar bastante com os filhos é também o exemplo. Nunca ingerir álcool em demasia na frente das crianças e jovens, mostrando que há limites saudáveis para sua ingestão. Proibir pura e simplesmente não é o caminho, pois eles sabem dos resultados ao ingerir, mas explicar que o álcool leva a dependência, e que pode ser consumido em doses baixas. Além disso, seu uso não pode ser frequente. Vale lembrar que só a partir dos 18 anos de idade é que o jovem pode consumir, não devendo nunca ser incentivado o uso antes disso, do mesmo modo como é necessário ter maturidade para dirigir um automóvel, é também para iniciar esse tipo de hábito. Valorizar as normas e as regras sociais é um valioso meio de preparar um filho para a vida.