Histórias no chão
Toda cultura, arte e patrimônio deve ser preservada para que a história possa ser passada adiante.
Toda cultura, arte e patrimônio deve ser preservada para que a história possa ser passada adiante. Diante dessa premissa, alguns móveis e imóveis municipais fazem parte do Patrimônio Histórico e Cultural de Pomerode. Atitude louvável, desde que a conservação e preservação deste patrimônio sejam efetivamente realizadas, o que não vem ocorrendo.
O Conselho Municipal do Patrimônio Histórico e Cultural de Pomerode é quem põe em prática as leis municipais relacionadas ao patrimônio histórico. Todavia, também é o Conselho que define e realiza o tombamento destes móveis e imóveis, afim de conservá-los.
A indignação de quem tem seus imóveis tombados é a falta de apoio dada pelo Conselho. Um imóvel quando é considerado patrimônio histórico, fica à mercê de uma série de critérios e regras de conservação e passa a ser de responsabilidade do Conselho.
Partindo do princípio de que uma casa, para ser considerada patrimônio histórico, precisa carregar as características do enxaimel em cada detalhe, os detalhes precisam ser mantidos e reformados, conforme necessidade, para que o tempo não os deteriore. E é justamente o tempo que esses patrimônios têm que os denigre.
A partir do momento que o patrimônio é tombado, ele só poderá passar por algum tipo de reforma, sempre mantendo as suas características originais, com a autorização do Conselho Municipal.
Não faz muito tempo que dois de nossos patrimônios históricos foram ao chão após tentativas frustradas de reforma. Reformas não autorizadas pelo Conselho. E mais, sem nem sequer ouvir um não como resposta, os prédios caíram à espera de um parecer e com eles, parte da história pomerodense.
Se em um canto da cidade há diversas casas preservadas para que a nossa Rota Enxaimel seja tão elogiada, em Testo Central, essa história toma outro rumo. A casa da família de Rufina Volkmann deixou de fazer parte da história no ano passado, quando desmoronou.
A casa, com mais de 150 anos, foi habitada até 2005, quando a família mudou-se para a nova residência com medo de que a casa desabasse sobre suas cabeças. O Conselho foi contatado para que averiguasse a situação e autorizasse a reforma, o que não foi autorizado.
Tendo em vista o bem-estar familiar, Nelson Volkmann começou a construir a nova residência no mesmo terreno. A obra teve que ser parada, pois o Conselho afirmou que a nova construção estava perto demais da antiga. No entanto, em virtude das más condições da casa em enxaimel, foi dada sequência à obra.
Após quatro anos na nova residência, a casa em enxaimel começou a cair. E foi no ano passado que desmoronou e deixou apenas uma parede em pé. Os pertences da família, assim com os tijolos, madeiras e demais materiais da casa ainda estão no chão, devido à falta de permissão na sua retirada.
Nelson Volkmann, filho de Dona Rufina, afirma que a família estava correndo risco de morte dentro da residência, que já dava sinais de desgaste. “Passamos risco de morte lá dentro. Gosto das casas, a madeira é boa, mas com o tempo os cupins tomam conta do teto que não resiste e cede”, completou.
Em nenhum momento foi permitida a reforma ou retirada de pertences, também considerados históricos, da residência. Agora, toda a história da casa que deveria ter sido preservada, está destruída.
A história de um patrimônio em ruínas e sem o cuidado necessário por parte do Conselho, não é uma história isolada na cidade.
Na quarta-feira, dia 13 de maio, mais um patrimônio deixou de fazer parte da história pomerodense. O famoso salão da família Koch, também em Testo Central, desmorou no final da tarde.
A história do salão começou nos anos de 1930. Não há registro exato da construção, mas há uma telha de 1930 e histórias afirmam que a construção ocorreu em 1934. Ricardo Koch, juntamente com seu filho, Afonso Koch, construíram o salão que até hoje pertence à família. Anexo ao salão há uma casa, que também é tombada pelo patrimônio histórico, e foi construída posteriormente.
Indiferente da data, é fato que o salão faz parte da história do município. Na época, o salão era utilizado para a realização de bailes e também havia uma mercearia no local. O extinto Distrito Rio do Testo, contava com o Clube de Caça e Tiro Dr. Wunderwald para animar os moradores da região.
O último baile realizado no salão foi em 1980. Desde então, ele era utilizado como estoque do mercado que foi construído do outro lado da rua. Em 2000, uma pequena confecção começou a funcionar dentro do salão e foi aí que a necessidade de reforma no forro foi notada, visto que os sarrafos germânicos estavam deteriorando-se. Reforma esta não autorizada pelo Conselho Municipal.
Desta maneira, o Conselho Municipal do Patrimônio Histórico e Cultural de Pomerode já tinha conhecimento do estado em que se encontrava o salão. Também no ano de 2000, a família contratou uma empreiteira local para reformar o telhado.
Desde então, a família Koch tem entrado em contato com o Conselho para que reformas pudessem sem realizadas. Os pedidos foram feitos verbalmente e nenhuma aprovação foi obtida.
No final de 2011, Alidor Koch fez um novo contato com um representante do Conselho para que medidas e providências de reparo fossem tomadas. A situação só estava piorando. Novamente sem nenhum retorno, em março de 2012, Alidor, juntamente com seu filho Ivan, fizeram um ofício solicitando, formalmente, a demolição do prédio. Ainda no ofício, a família dispôs-se a aproveitar o que estava em bom estado e fazer uma doação para museus locais, com o intuito de retratar a colonização. A demolição também seria realizada de forma coerente e organizada, sempre visando o bem-estar da família que ainda morava ao lado do salão. Novamente nenhum posicionamento do Conselho.
A situação só se fez piorar e entre os dias 08 e 10 de junho, com a chuva e o vento que ocorreram, o telhado cedeu bruscamente. A família saiu de casa e no dia 11 de junho, entrou em contato com o Conselho. E foi então que a funcionária Cristina informou que o pedido de demolição havia sido negado.
No dia 12 de junho, pela manhã, uma representante do Conselho foi averiguar a situação do salão e afirmou que ainda havia recuperação para o mesmo. Ainda neste dia, e vendo que o prédio poderia desmoronar a qualquer instante, a família Koch, junto com a Sodeci, fez o isolamento da área para que ninguém se ferisse, caso algo acontecesse.
Na tarde do dia 12, a representante voltou ao salão, com o compromisso de trazer mais conselheiros, o que também não ocorreu, pois apareceu sozinha. A família, já ciente de que o prédio não tinha recuperação, estava com um engenheiro e empreiteira no local que constataram que nada mais poderia ser feito para a recuperação do salão.
Diante da situação, a autorização de demolição do prédio foi dada no dia 13 de junho. Depois dessa autorização, a família entrou no prédio com o intuito de salvar os pertences que ainda estavam no local. Tarde demais para isso, pois às 17h40min, o prédio ruiu sozinho.
A casa de Alidor Koch, que está anexo ao prédio, não foi atingida pela queda do salão, mas a família não estava mais no local desde o dia 10 de junho, devido ao risco que corria. A casa em que mora foi reformada e está dentro da legislação de preservação de bem histórico.
Após a queda do telhado, a família tirou das ruínas parte de sua história. “Perdemos uma parte da história, mas a vida é mais importante do que isso”, disse Ivan Koch. A partir de agora, a família está se reunindo para fazer novos projetos com o que restou do patrimônio.
O agradecimento da família Koch vai para o empenho do Prefeito Municipal, Defesa Civil, Sodeci, Samae e Secretaria de Obras, que não mediram esforços para auxiliar nos trabalhos realizados no local.
O Conselho Municipal do Patrimônio Histórico e Cultural de Pomerode não é de responsabilidade da Prefeitura Municipal, portanto, todas as críticas e cobranças de quem teve seu patrimônio considerado histórico, vão para o Conselho que não está trabalhando para o bem estar dessa história.
O que diz o Conselho
O Conselho Municipal do Patrimônio Histórico e Cultural de Pomerode esclareceu algumas dúvidas sobre seu funcionamento e emitiu uma nota oficial em relação ao caso do Salão da família Koch.
Os esclarecimentos dados foram acerca dos critérios utilizados para decretar que um imóvel seja considerado patrimônio histórico. De acordo com os representantes do Conselho, todos os imóveis enxaimel do município são considerados patrimônios, no entanto, nem todos são tombados. Além de outros que não possuem esse tipo de característica germânica, mas que são igualmente importantes para a preservação da história da Cidade Mais Alemã do Brasil. As construções somam, nos dois casos, mais de 200 imóveis. Ainda conforme o Conselho, apesar de fazer parte da história, estes imóveis estão sob a responsabilidade de seus proprietários, em primeiro plano.
Ao ser questionado sobre o retorno das solicitações de reforma ou demolição, o Conselho afirma que nunca impediu que uma reforma fosse feita e que apenas sugere o material que deve ser utilizado nessa reforma, afim de manter as características originais.
A verba recebida pelo Conselho é oriunda da Secretaria de Cultura e, esporadicamente, dos Governos Estadual e Federal. O valor disponível para o ano de 2011 foi de quase R$ 113 mil. Valor ínfimo, se levado em consideração o número de casas consideradas parte do Patrimônio Histórico.
Conforme a conselheira do CMPHC, Roseana Struck, os proprietários acreditam, na sua maioria, que por se tratar de um imóvel tombado, a obrigação total da preservação do mesmo é do município, que por sua vez, já os isenta do pagamento do IPTU. “Não cabe a nós, ainda mais com a verba que temos disponível, arcar com todas as despesas. Muitos esperam os imóveis praticamente desmoronarem para tomar uma posição. Se pequenas melhorias fossem feitas no decorrer dos anos, a situação não chegaria a esse ponto. Pomerode conta hoje com cerca de seis imóveis que não possuem mais recuperação”.
Complementando, a Presidente do CMPHC, Sandra Cristina Nienow, relatou: “existe apenas uma pessoa responsável pelo acompanhamento destes imóveis. A demanda é muito maior do que a capacidade de suprir todo esse trabalho. Nós conselheiros acabamos, além da reunião mensal que realizamos, indo até esses locais para averiguar a real situação dos imóveis. Autorizamos a demolição na última das hipóteses, pois nos dói ver a história do município se findando”.
No decorrer da entrevista, foi constatado que algumas falhas do Conselho, ao que tudo indica, não têm previsão de serem solucionadas. Como, por exemplo, a notificação inexistente de que determinado imóvel passou a ser patrimônio histórico. “Não avisamos formalmente. Cabe ao proprietário imaginar que se ele passou a ser isento do IPTU, é em decorrência de algo previsto em lei, no caso o tombamento”, explicam os conselheiros.
Mais ineficiente ainda é a forma com que os proprietários destes imóveis são notificados e instruídos. “Muitos mal falam o português, sabemos que a compreensão é difícil, fazer através de um ofício é burocratizar o que fazemos, na maioria dos casos, de forma verbal”, disse Roseana.
O Conselho
O Conselho Municipal do Patrimônio Histórico e Cultural de Pomerode (Compatri) criado em 2002, é vinculado ao Serviço de Patrimônio Histórico Municipal. O Patrimônio Histórico, Artístico e Natural de Pomerode está protegido pela Lei Municipal nº 1639/02, que também rege as atividades do Conselho e pela Lei Complementar nº 162/08.
Enquadram-se dentro do apelo de proteção especial do Poder Público Municipal os bens móveis e imóveis existentes em seus limites, cuja conservação e preservação sejam de interesse público e que importe conservar e proteger pela feição notável com que tenham sido dotados ou por sua importância histórico-cultural.